Texto II
O texto que se segue e de cunho espirita e foi tirado do livro “Deixe-me viver”, de autoria do espirito Luiz Sérgio, psicografia de Irene Pacheco Machado.
“MÃE, NÃO ME MATE, DEIXE-ME VIVER”.
“Deixai vir a mim os pequeninos e não os embaraceis (Marcos, X, 14).”
“Yura – Sequelas da Insensatez”
“À medida que me inteirava das estórias daqueles espíritos, mais me comovia. A humanidade está cada vez mais materialista e é esse materialismo que hoje faz aumentar as clinicas do aborto.
Aqui, na Colônia dos Rejeitados, estamos vivendo ao lado das vitimas da liberdade sexual. Na nossa frente, os rejeitados, os filhos assassinados por mulheres que não aprenderam a respeitar a si mesmas.
__ Veja, Sérgio, aquela menina: no momento do seu desencarne, ou melhor, na hora do aborto, plasmou esse corpo de uma criança de dois anos e aqui se encontra há quatro anos. Por mais que receba tratamento, teima em não crescer e encarnar de novo. Vamos até lá, quero que a conheça.
Ao nos aproximarmos, ela buscou o colo da irmã Rosália, encolhendo-se toda, trêmula de medo e choramingando, assustada.
__ Não fique assim, querida, o titio já vai embora, disse-lhe eu.
Alisei seu cabelo e me retirei. Loreta me acompanhou pedindo desculpas.
__ Sabe, Sérgio, vou lhe contar a vida e a luta de Yura para nascer. Dizem que é da sua ultima encarnação o nome que hoje usa. Foi mulher lindíssima, quando viveu no plano físico. Desencarnou, mas precisou retornar ao seio da sua antiga família. Aí, iniciou-se a sua tortura. Após longo aprendizado, chegou o momento da volta à carne e com apenas dois meses de vida uterina recebeu violenta carga negativa de repulsa ódio. Por mais que implorasse que a deixassem viver, sentiu a violência do homem encarnado, infligindo-lhe um dos mais cru eis métodos abortivos: aquele no qual sentiu sobre a sua frágil pele a queimação. Desesperada, viu-se tragada por uma água fervente e, para não sofrer demais, plasmou em sua mente que era uma linda menina de dois anos de idade. O corpo foi jogado fora, mas sua alma foi amparada pela Mão sublime de Maria de Nazaré. Yura reluta em voltar à carne e até hoje não se reequilibrou. Assim como Yura, vários e vários espíritos estão sendo arrancados do útero materno selvagemente e nada se diz, nada se faz: quando se faz é para pedir a liberação desse ato covarde em nossa Pátria.
__ Você tem razão, Luiz Sérgio, a mulher que interrompe covardemente uma gravidez um dia sofrerá não só com os remorsos, como também por ter violentado o próprio corpo.
Encontrava-me cansado. Fui saindo, contando os meus passos. Meu coração chorava baixinho em imaginar o compromisso de um aborteiro, o seu desespero ao transportar a porta da espiritualidade, quando o dinheiro ganho fácil não lhe servirá para nada e a consciência culpada pelo remorso será um fardo pesado de carregar.
Conivência dos Pais
Um dos encarregados do socorro pediu nossa ajuda para uma jovem de dezesseis anos que naquele dia iria revelar ao namorado sua gravidez. Kelly e Hápila logo se prontificaram a auxiliar e dali saímos em busca de Rosalinda. Encontramo-la diante do namorado e este, assombrado, dizia:
__Eu não posso assumir essa responsabilidade, vamos dar um jeito nisso.
__Mas eu quero o meu filho!
__ Então, minha querida, se vire sozinha, não conte comigo. Estou comprando um imóvel e depois vou para a Europa fazer mestrado. Meus pais enlouquecem se eu falar da sua gravidez, Rosalinda. O que posso fazer é conseguir a grana para você se desfazer da coisa.
Olhei para os meus amigos, principalmente uma nova caravaneira que se juntara a nós: Glessi. Esta, com a expressão de surpresa, era a imagem da preocupação. Aproximou-se do rapaz, que nada tinha de bom no coração, e este, apesar de intuído por nós, continuava no firme propósito de assassinar o próprio filho. Encontrava-se tranquilo com sua decisão. Glessi então chegou perto da garota, mas esta, sentindo-se sozinha, retrucou ao namorado:
__ Arrume então a grana. Tenho uma colega que já abortou; pedirei a ela o endereço do medico hoje mesmo. A que horas você me entrega o dinheiro?
__ Às duas horas da tarde, está bem?
Aqueles dois nem pareciam já ter desfrutado algumas horas de carinho, pois conversavam com a maior frieza.
__A que pé chega um relacionamento carnal sem amor e sem respeito, comentou Amintas.
Seguimos a mocinha e tudo fizemos para que tivesse força suficiente para enfrentar sua gravidez. Mas ela não concebia ter um filho sem a presença paterna e ali, estirada na cama do seu belo quarto, chorava desesperada. A mãe entrou e lhe perguntou:
__ Por que choras, querida?
__ Estou grávida e abandonada por Leandro __ disse-lhe, intuída por nós.
A mãe sentou-se, tamanha surpresa.
__ O que? Abandonada? Você é que pensa! Ele é obrigado a casar com você. Vou chamar o Máximo.
__ Mamãe, por favor, não o quero à força. Se ele não me ama, como posso casar com ele?
A mãe xingou tanto, fez tanto escândalo até a chegada do marido, que Rosalinda estava decidida a fugir de casa. Pensamos: “com o marido as coisas melhoram”. Mas que nada Máximo apenas não gritou, pediu para a filha e a mulher se sentarem diante dele e respondeu:
__ Nada de desespero, aconteceu, aconteceu. Eu sempre achei, filha, que você estava abusando da liberdade. Mas quero que fique bem claro: eu não suporto um escândalo em minha carreira pública. A política não permite esses fatos tão desagradáveis. Precisamos, juntos, encontrar uma solução que não atrapalhe minha candidatura. Estou preparado para as próximas eleições e não é você, minha única filha, que vai prejudica-me. Mesmo que Leandro desejasse casar, não estamos em condições de fazer uma festa à altura da nossa posição social. E, como vocês duas estão dizendo que ele não deseja casar, forçá-lo seria desastroso. Isso nunca. Tenho alguns amigos médicos que podem fazer caridosamente a interrupção desta gravidez. Irei procurá-los e logo estaremos livres deste fato desagradável. Posteriormente, vocês duas partem para a Europa e Rosalinda ficará estudando lá.
__ Quer se ver livre de mim também?
__ Pense como quiser, filha. Ninguém vai atrapalhar minha projeção política .
A mãe acariciava os longos e belos cabelos da filha. Esta chorava, por sentir o quanto estava sozinha. Nós fizemos de tudo, mas Máximo e a esposa não queriam envolver-se em um escândalo e Rosalinda estava gravida de alguém que não a queria por esposa. Era demais para aquele orgulhoso pai. Perguntei a Kelly:
__ E vamos deixar que realizem o aborto?
__ O que fazer, Luiz Sérgio? O livre-arbítrio pertence ao homem e ninguém pode roubar-lhe esse direito.
Um dos amigos influentes de Máximo preparou em sua clínica o aborto de Rosalinda. Na sala de espera, o olhar de ansiedade de todos nós. Quando ela deu entrada na sala abortiva, pareceu-me que aquelas paredes choravam; era um lugar de desespero. Existem muita clínicas espiritas da Falange de Maria de Nazaré que fazem plantão de socorro para salvar almas. Porém ali, diante de nós, um médico que recebeu de Deus o dom de curar estava preparando-se para matar um indefeso ser. Presenciamos o desespero do feto; ele se debatia apavorado ao pressentir sua morte. Rápido, muito rápido, o ato cruel. O médico tinha muita pratica. Pena que ele, ao interromper a gravidez de Rosalinda, não pôde perceber as lágrimas nos olhos daquela forma fetal e o seu martírio. Era uma linda menina, e como gritava apavorada. A doutora Ísis envolveu-a em seus braços e dali saiu, levando-a com carinho. Olhei Rosalinda: apenas uma criança e tão marcada pela vida. Pensei: “será que ela vai parar aqui ou vai ainda assassinar muitos outros filhos?”
Saímos atrás de Ísis, que tudo fazia para acalmar o espirito que sofrera a rejeição; mas ele gemia, o corpo todo queimado, sentindo a cruel realidade de um aborto. Enquanto isso, Rosalinda era cuidada pelo médico amigo de seu pai. Ela nem imaginava que sua f ilha agora também recebia cuidados médicos e, como todos os abortados, sofria a pior das dores: a da rejeição. Ísis ajudada pelos socorristas, encaminhou-se para um Centro espirita e lá, com a ajuda de outros médicos, foi a criança levada a um trabalho espiritual, recebendo fluidos tranquilizantes que aliviaram a queimação que sentia em seu corpo. Perguntei ao médico do Centro até quando a criança iria ficar ali.
__ Logo será levada para um hospital da erraticidade, onde aguardará nova oportunidade.
__ Meu Deus, que pratica o aborto não imagina como está infringindo as lei de Deus! Soube que nessas clínicas fazem de trinta a quarenta abortos por dia.
__ É mesmo, Luiz Sérgio, essas intervenções estão aumentando de tal maneira, que ninguém é capaz de avaliar seu crescimento. Em nosso Centro já contamos com uma enfermaria exclusivamente para socorrer os abortados. Em um Centro espírita deve também existir a prece para os rejeitados. Para você uma ideia, atendemos mais abortados do que suicidas. Hoje o aborto é praticado sem piedade no mundo inteiro.
Virei-me para a garotinha e falei a Kelly:
__ Gostaria de ver como se processou a sua encarnação.
O doutor Salles nos convidou a acompanhá-lo e foi passando o filme sobre Rosalinda, seu namorado Leandro e o contato dos dois com o espirito que acabaram por jeitar.
__ Quem é a velhinha? Perguntei ao doutor Salles.
__ A mãe de Máximo, avó de Rosalinda.
__ A mãe dele?
__ Sim. Ela adora a neta, por isso se propôs a voltar como sua filha. Ela criou Rosalinda até os seis anos.
Vimos Leandro e Rosalinda sendo levados à espiritualidade e ela adorando o contato com a vó. “Que bom que a senhora vai voltar, e ainda como minha filha. Lutarei pela sua felicidade”. Tudo certinho, os dois prontos para receberem a filha. O contato entre eles era de muita paz. Assistimos à comovente despedida da avó com seu esposo, ele ainda ficaria alguns anos no mundo espiritual, entretanto ali na enfermaria dos abortados jazia um corpo de criança, todo dolorido. Mais machucado ainda se encontrava o seu espirito por saber-se desprezado pelo filho e pela neta que adorava. Como será o último capítulo desta estória? Não sabemos quanto tempo permanecerá no corpo de criança e se Rosalinda um dia vai conseguir ter filhos.”
Uruaçu, 27 de setembro de 2011.
Na próxima semana postaremos o texto seguinte.